quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Escola sob medida e Educação para o Caos






Olhe a sua volta, vê alguém exatamente como você? Como é possível supor que sejamos tantos e tão diferentes e que uma única escola dê conta de toda diversidade? Considerando a pluralidade de feitios, é impossível haver uma escola dos sonhos única que pudesse atender a demanda de todos ao mesmo tempo. Acho que o melhor seria recuperarmos a ideia do psicólogo Claparéde, da Escola Sob Medida. Assim, cada pessoa com seu feitio teria uma escola que a acolhesse em suas habilidades, gostos e limitações. A ideia seria pensar muitos tipos diferentes de escola, para os muitos tipos diferentes de pessoas, e até mesmo a ausência delas, para aqueles que não se relacionam bem com as escolas. Nesse caso, estas pessoas poderiam ser educadas em casa ou em outras situações educativas, como acontece com as crianças que vivem e trabalham em circos, as ciganas, as refugiadas da guerra e da fome, as que navegam com os pais pelos mares do mundo!
Para aquelas escolas que existiriam como escola, penso que alguns itens deveriam estar presentes obrigatoriamente. Uma casa na árvore seria indispensável, uma espécie de torre de observação, ou quem sabe um mirante. Os alunos passariam ali horas estudando, observando os pássaros, gravando-os.... Cada escola deveria ter uma piscina olímpica, auditório com coxia e cortinas, tela para projeção de cinema ao ar livre, relógio de sol, pelo menos uma fonte luminosa pequenina, horta e canteiros (caso fosse inviável um jardim). Acho que as escolas deveriam ter também animais de estimação que fossem mantidos, cuidados e acarinhados por todos. Seria interessante ver uma aula ser repentinamente interrompida pela indiferença elegante de um gato, entrando por uma porta e saindo pela janela. Poucas situações configuram-se mais como lição de humano que a convivência com animais.
Nenhuma escola deveria preferir o prático ao belo. Beleza não pode ser considerada luxo, é algo que alimenta o espírito e tempera os desejos. Por isso, as escolas presenciais deveriam ser bonitas e acolhedoras, com inúmeros convites à contemplação: painéis, quadros, mosaicos, janelas amplas. Escolas amadas são escolas que a comunidade preserva e cuida. Além das salas de aula, a escola deve ter muitos espaços que convidem os alunos “a ficar”, com cadeiras e poltronas confortáveis, mesas ao ar livre. Quando um lugar tem cadeiras confortáveis é porque deseja que as pessoas fiquem por ali.
Ninguém seria obrigado a nada nestas versões da escola dos meus sonhos. Os alunos poderiam entrar e sair quando desejassem, bastando comunicar aos professores. Ninguém seria reprovado por faltas. Afinal, as aulas precisam ser encontros agradáveis para que os alunos queiram estar lá, sem que seja preciso controlar a presença deles. Não haveria deveres para casa. As tarefas deveriam ser realizadas todas na escola.
Talvez, se houvessem tantas escolas diferenciadas, fosse preciso existir também professores com diferentes performances (ou será que já não é assim??). Professores mais tradicionais, professores que gostariam de trabalhar com as saídas de campo, professores que prefeririam trabalhar com o uso de tecnologias, professores que gostariam de trabalhar em grupo com outros professores, professores que preferem estar só em suas aulas, professores que gostem de tudo um pouco. Afinal, é preciso respeitar os feitios dos professores também, deixá-los confortáveis e confiantes em suas aulas.
Independente dos conteúdos aprendidos, a maior aprendizagem pretendida por qualquer destas escolas dos meus sonhos seria a metacognição. É impossível educarmos quem quer que seja sem torná-lo capaz de fazer a gestão da sua própria aprendizagem. Os alunos seriam incentivados a identificar pontos fortes e pontos fortes nos processos cognitivos e a avaliar permanentemente se estão a aprender ou não.
Outra aprendizagem que estas escolas devem ter como meta, é uma espécie de Educação para o Caos. Nossos alunos precisam saber transitar tanto pela ordem quanto pela desordem. O desconcerto que a multiplicidade causa em muitos de nós, é porque só fomos educados para a ordem e qualquer desordem, mesmo que temporária, nos paralisa. Por isso é tão importante que os alunos vivenciem o caos e os muitos caminhos nele existentes, aprendendo a escolher e a justificar suas escolhas.
O tempo, nestas escolas dos meus sonhos, deveria ser reinventado. Os alunos seriam orientados a respeitar os ritmos biológicos. Aqueles que precisassem tirar um cochilo depois do almoço teriam sua rede à sua espera. O mesmo se aplicaria aos dorminhocos de fim de tarde (como acontece comigo!).  Os primeiros horários da manhã, quando o frescor matutino dá a impressão de um friozinho, só seriam utilizados por aqueles que se sentissem absolutamente à vontade com o acordar e trabalhar tão cedo. Bocejou? Volte para a casa e durma mais um pouco!
Nestas escolas dos meus sonhos, o professor é a figura mais importante (sem essa de que as escolas só existem porque existem alunos... estes chegam e se vão... os professores ficam!). O professor é o coração de uma escola, se ele não pulsa a escola fenece. Ele precisa ter olhos brilhantes e fala apaixonada: seja por um filme que viu no cinema, um poeta, ou mesmo uma imagem. Sobretudo, o professor precisa estar feliz.


 


Ana Paula Bossler
Professora na Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) em Uberaba, no Triângulo Mineiro. Trabalhou por uma década com o ensino de ciências para deficientes visuais. Tem como áreas de interesse aprendizagens no rádio, televisão e cinema. Adora costurar! 



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